domingo, 19 de fevereiro de 2012

PT 32 anos: O PT, mais por suas virtudes que por seus defeitos, e mais rápido que todos esperavam e que qualquer partido de esquerda, chegou lá com Lula em 2002, de novo em 2006 e pela primeira vez elegeu uma mulher presidenta, Dilma Rousseff, em 2010.

Via Adital


Um senhor maduro

Selvino Heck
Assessor Especial da Secretaria Geral da Presidência da República
Adital


É um senhor maduro, este, o que esteve de aniversário sexta dia 10, embora pratique algumas inconsequências de vez em quando e eventualmente ande em companhias não tão recomendáveis. Mas está adulto, senhor de si, pleno de vida, dono de seu nariz e destino.

Falo do Partido dos Trabalhadores, fundado em 10 de fevereiro de 1980. A tentação, para quem é, como eu, um de seus fundadores, é relembrar o passado, daqueles tempos bons, mas também difíceis. De como a base popular participava da política através dos Núcleos do PT, como o que organizamos em 1980 na Lomba do Pinheiro, periferia de Porto Alegre e Viamão, na casa do pedreiro José Carlos Pintado, Seu Cantilho, onde nos reuníamos regularmente para aprender a fazer política, a participar de eleições com nossos candidatos populares, coisas que nunca tínhamos feito na vida. De como o partido fazia parte da vida da gente, como o faziam a Associação de Moradores, as Oposições Sindicais, as Comunidades Eclesiais de Base, a Pastoral Operária e os grupos de reflexão da Bíblia. De como lutávamos pela democratização do Brasil, por eleições diretas em todos os níveis. De como os primeiros mandatos de deputados e vereadores eram mandatos populares, colados à vida do povo, presentes em todas as lutas e mobilizações sociais dos pobres e trabalhadores. De como o Orçamento Participativo, com Olívio Dutra prefeito de Porto Alegre, foi uma revolução silenciosa no jeito de governar com o povo e com democracia – modo petista de governar -, experiência que ganhou o mundo.

Passaram-se 32 anos. A criança cresceu, o jovem apresentou-se à sociedade, angariou simpatias cada vez maiores e chegou à Presidência da República. O PT, mais por suas virtudes que por seus defeitos, e mais rápido que todos esperavam e que qualquer partido de esquerda, chegou lá com Lula em 2002, de novo em 2006 e pela primeira vez elegeu uma mulher presidenta, Dilma Rousseff, em 2010.

O senhor maduro, bem instalado na vida, precisa, porém, olhar para os lados, fazer um balanço e decidir o que fazer do futuro. Três são os dilemas principais: ser movimento e instituição; como lidar com os fins e os meios; qual o projeto, o sonho, a utopia.

No 1º Congresso do PT, início dos anos 90, o partido assumiu-se ao mesmo tempo movimento e instituição. Movimento, porque relaciona-se com a sociedade, em especial com os movimentos sociais, populares, sindical e as forças transformadoras, através de um programa, deve estar em permanente mudança e aberto ao novo, com capacidade de refletir sobre os novos tempos e os novos atores que surgem na conjuntura. Instituição, porque, por via eleitoral, participa de eleições e governa dentro das regras do jogo, está submetido, junto com as demais instituições brasileiras, à vida democrática e a suas imposições legais e constitucionais.

Os fins não justificam o uso de quaisquer meios, seja na disputa política eleitoral, seja na prática de governar ou de atuar no parlamento, ou na relação com a sociedade. A prática democrática e educativa, a vivência cotidiana da ética na política são a garantia de que o mundo novo, o novo homem e a nova mulher que se quer construir e ser, de fato vão acontecer.

Partido político como o PT, de esquerda, que veio para mudar, só tem sentido e sobrevive ao tempo se tiver um programa de transformação, se seus filiados e militantes mantiverem vivo o sonho de uma sociedade democrática, com justiça social, com igualdade econômica e lutarem pela utopia de ‘um outro mundo possível’.

Ao longo dos 32 anos do senhor maduro, muitas vezes o partido-instituição matou o partido-movimento, os supostos fins libertários, como em episódios mais ou menos recentes e em processos eleitorais, abrigaram meios nem sempre recomendáveis e de acordo com um partido da mudança, e muitas vezes o projeto, o sonho, a utopia renderam-se ao pragmatismo das alianças políticas, às formas de governar nem sempre transparentes e transformadoras.

Como tudo que se cria como movimento, necessariamente se institucionaliza com o tempo - e há muitos e próximos exemplos que confirmam a regra -, a dificuldade maior é manter o carisma, garantir acesa a chama de não se entregar ao jogo do mercado e da corrupção, não deixar-se dominar pela rotina e pela mesmice, ter olhos e ouvidos abertos, ser criativo, mirar no horizonte e não ficar limitado ao chão onde se pisa. Não é fácil, mas é necessário, imprescindível, para qualquer comunidade, congregação religiosa, movimento social e partido político. Para não tornar-se um morto-vivo ou ser varrido da história.

Mesmo com estes dilemas, a serem permanentemente enfrentados, o Partido dos Trabalhadores tem o que dizer e o que comemorar, no contexto histórico da política brasileira. Os tempos mudaram e a verdade se impôs. Ao contrário do que se dizia, o PT nunca foi bicho papão. Prova disso são as realizações ao longo dos 32 anos, a luta pela democratização do país, as inovações dos governos onde participou e participa, a dedicação a um projeto de país soberano, a defesa dos mais pobres e dos trabalhadores, razão principal de sua criação, a ressignificação da política como instrumento importante de ação coletiva e da construção de uma nação justa e soberana.

Em dezessete de fevereiro de dois mil e doze

domingo, 5 de fevereiro de 2012

Para tristeza da velha mídia golpista Dilma, assim como Lula, não se rende à agenda ditada de Washington.

Via Tijolaço

Do sempre lúcido Mair Pena Neto, no Direto da Redação:
“A presidente Dilma Rousseff completou uma viagem de 48 horas a Cuba, comportando-se como verdadeira estadista, reforçando as relações entre os dois países e evitando os ardis plantados para que agisse como porta-voz dos Estados Unidos, reproduzindo as ladainhas provenientes de Miami e da Casa Branca. Dilma foi a Cuba em visita oficial para estreitar os laços com um país que precisa de mais investimento e de mais produtividade para avançar economicamente e manter suas conquistas sociais.
Assim como aconteceu com Lula, foi cobrado de Dilma que se manifestasse sobre a situação dos direitos humanos em Cuba. O que os responsáveis pelas cobranças desejavam, no fundo, era que ela sequer fosse lá, como todos os presidentes brasileiros desde a revolução de 1959 até Lula. Mas já que Dilma, assim como Lula, não se rende à agenda ditada de Washington, que se manifestasse publicamente contra as restrições políticas na ilha.
É curioso como a questão dos direitos humanos em Cuba “sensibiliza” tanto certas pessoas. Não se vê a mesma indignação em relação a qualquer outro país. Ninguém pediria que Dilma, em viagem aos Estados Unidos, se posicionasse publicamente pelo fechamento de Guantánamo, em pleno território cubano, mesmo com a cobrança recente feita pela alta-comissária para os Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas, Navi Pillay, que apontou a base como local de constante violação destes direitos.
Dilma se recusou a tratar a questão dos direitos humanos como arma de combate político ideológico, e frisou que desrespeitos acontecem em todos os países, inclusive no Brasil. Não seria nada agradável para nós recebermos a visita de um chefe de Estado estrangeiro e ouvir comentários sobre a violência da ação de despejo dos moradores do Pinheirinho ou sobre a desumanidade da maior parte dos nossos presídios.
O Brasil é um país que aposta nas relações multilaterais como forma de pressão e de resolução de conflitos. Ele não vai fazer o papel de juiz do mundo e sair por aí condenando outros países, até porque tem suas próprias mazelas. Isso não significa omissão, pois o Brasil ganhou recente relevância no cenário internacional justamente por sua ação diplomática independente e soberana, que o leva a ser convocado a atuar nas mais complexas questões mundiais. Temas delicados, como direitos humanos, não se tratam com bravatas unilaterais, principalmente quando envolvem nações em situações extraordinárias, como a cubana, vítima de um bloqueio implacável há meio século.
Diria que a visita da presidente do Brasil a Cuba transcorreu de forma impecável e com acentuado caráter político. No trabalho prévio às 48 horas que ela passou na ilha, o chanceler brasileiro Antonio Patriota conversou com autoridades cubanas sobre questões relativas aos direitos humanos, e o Brasil concedeu visto de turista à blogueira Yoani Sánchez, que deseja vir ao país. Ao mesmo tempo, Patriota não aceitou o discurso fácil da condenação e, assim como Dilma faria em solo cubano, ressaltou que uma questão mais urgente e multilateral seria o fim da base de Guantánamo.
Com o crescimento de sua economia e a capacidade financeira de que dispõe atualmente, o Brasil tem muito mais a contribuir com Cuba ajudando no seu desenvolvimento, com implicação direta no bem estar das pessoas. As relações comerciais cresceram 31% de 2010 para 2011, e o Brasil é o segundo parceiro comercial de Cuba na América Latina, depois da Venezuela. Existem oportunidades para empresas brasileiras em Cuba, como provam as obras de ampliação e modernização do porto de Mariel, com a participação da Odebrecht.
Cuba precisa melhorar sua agricultura e recuperar seu parque produtivo, e o Brasil pretende participar deste esforço com a tecnologia e os processos desenvolvidos pela Embrapa, e, sobretudo, com um olhar mais solidário em relação aos vizinhos latino-americanos. Sentimento este, por sinal, muito inspirado por Cuba e seu internacionalismo, sempre manifestado pela presença de médicos e professores, onde for necessário, e não pelas armas ou posturas imperialistas.”

"Para além dos cálculos e dos códigos, dos cassetetes e dos tratores, existem vidas esperando ser simplesmente consideradas."



Via blog do Miro

Fascismo esmaga a solidariedade

Por Marcelo Semer, no blog Sem Juízo:
 

Meses atrás, manchetes de grandes jornais davam conta de que cem mil presos iam sair das cadeias da noite para o dia com a nova lei das prisões.

A fotografia de uma delegacia em Goiás nesta semana, com detentos jogados ao chão e algemados na parede por falta de vagas dá bem o retrato do embuste que foi a criação dessa expectativa.

Mas o discurso do medo teve lá a sua serventia. Como diz o escritor Mia Couto, "Para fabricar armas é preciso fabricar inimigos. Para produzir inimigos é imperioso sustentar fantasmas".


Esse discurso elevado propositadamente à enésima potência tem servido para legitimar, se é que o verbo pode se adequar a hipóteses tão dramáticas, a política de ordem e disciplina que vem pouco a pouco se instalando em corações e mentes.

A forte repressão, policial e jurídica, à marcha da maconha; a tropa de choque contra estudantes na USP; a polícia na linha de frente da saúde pública, na Cracolândia; o abrupto despejo de milhares de almas em Pinheirinho.

Como drogados, estudantes rebeldes, famílias inteiras foram submetidas a doses de dor e sofrimento em nome do restabelecimento da ordem. Afinal, onde ficaria o respeito à propriedade privada e à decisão judicial?

Mas será que um terreno de um milhão de metros quadrados vazio por décadas, ao lado de milhares de pessoas que não têm onde morar, também não seria por si só uma violação da ordem?

Com o apoio de um certo terror midiático, que busca convencer que o fim do mundo está na próxima esquina, as políticas de estado vão sendo paulatinamente subordinadas a decisões bélicas -é basicamente disso que se trata quando a PM prepara por meses a inteligência de suas intervenções.

Acontece com frequência incomum na São Paulo atual, mas não apenas nela. Militarização e repressão tem se espalhado por outros cantos do país.

A supervalorização da ordem desconsidera, sobretudo, a solidariedade, fundamento dos principais objetivos de nossa República.

Eles ainda estão lá perdidos no art. 3º, da Constituição e lidos hoje parecem pouco mais do que contos de fada: "construir uma sociedade livre, justa e solidária; erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos...".

Se isso tudo que está no coração da Lei Maior não vale nada, como ensinar ao povo que a lei deve ser cumprida? Com a força e pronto.

O pior de tudo é que nossa experiência recente ensinou que a solidariedade, além de justa, produz efeitos colaterais irrenunciáveis.

As políticas de transferência de renda vitaminaram uma considerável ascensão social e revigoraram o mercado interno consumidor, importante para amortecer o peso da crise mundial.

É preciso apostar mais nas pessoas e não menos. Emancipar o povo fará do Brasil um país muito melhor -sacrificá-lo, o devolverá ao passado, não à modernidade que tanto se apregoa.

Afinal, privilegiar a ordem sem solidariedade é investir na mera dominação. Usar a polícia para tutelar a propriedade privada é coisa que se faz no país desde a escravatura. Mas a supervalorização da ordem que se vê hoje pode ir além do que o tradicional predomínio do mais forte: é um passaporte para o fascismo.

Um jornalista da Rede Record chorou em plena produção da reportagem quando viu uma criança de dois anos, chupeta na boca, sentada sobre um tijolo de sua casa despedaçada em Pinheirinho, talvez sem entender o que acontecia.

Também foi impossível ver a imagem do preso goiano deitado e algemado na parede e não se lembrar da amarra de um animal indócil.

Quiçá possamos ser um pouco reféns dessas imagens que nos perturbam e nos comovem.

Para além dos cálculos e dos códigos, dos cassetetes e dos tratores, existem vidas esperando ser simplesmente consideradas.

Por quanto tempo vamos ignorá-las?