Um senhor maduro
Selvino Heck
Assessor Especial da Secretaria Geral da Presidência da República
Adital
É um senhor maduro, este, o que esteve de aniversário sexta dia 10, embora pratique algumas inconsequências de vez em quando e eventualmente ande em companhias não tão recomendáveis. Mas está adulto, senhor de si, pleno de vida, dono de seu nariz e destino.
Falo do Partido dos Trabalhadores, fundado em 10 de fevereiro de 1980. A tentação, para quem é, como eu, um de seus fundadores, é relembrar o passado, daqueles tempos bons, mas também difíceis. De como a base popular participava da política através dos Núcleos do PT, como o que organizamos em 1980 na Lomba do Pinheiro, periferia de Porto Alegre e Viamão, na casa do pedreiro José Carlos Pintado, Seu Cantilho, onde nos reuníamos regularmente para aprender a fazer política, a participar de eleições com nossos candidatos populares, coisas que nunca tínhamos feito na vida. De como o partido fazia parte da vida da gente, como o faziam a Associação de Moradores, as Oposições Sindicais, as Comunidades Eclesiais de Base, a Pastoral Operária e os grupos de reflexão da Bíblia. De como lutávamos pela democratização do Brasil, por eleições diretas em todos os níveis. De como os primeiros mandatos de deputados e vereadores eram mandatos populares, colados à vida do povo, presentes em todas as lutas e mobilizações sociais dos pobres e trabalhadores. De como o Orçamento Participativo, com Olívio Dutra prefeito de Porto Alegre, foi uma revolução silenciosa no jeito de governar com o povo e com democracia – modo petista de governar -, experiência que ganhou o mundo.
Passaram-se 32 anos. A criança cresceu, o jovem apresentou-se à sociedade, angariou simpatias cada vez maiores e chegou à Presidência da República. O PT, mais por suas virtudes que por seus defeitos, e mais rápido que todos esperavam e que qualquer partido de esquerda, chegou lá com Lula em 2002, de novo em 2006 e pela primeira vez elegeu uma mulher presidenta, Dilma Rousseff, em 2010.
O senhor maduro, bem instalado na vida, precisa, porém, olhar para os lados, fazer um balanço e decidir o que fazer do futuro. Três são os dilemas principais: ser movimento e instituição; como lidar com os fins e os meios; qual o projeto, o sonho, a utopia.
No 1º Congresso do PT, início dos anos 90, o partido assumiu-se ao mesmo tempo movimento e instituição. Movimento, porque relaciona-se com a sociedade, em especial com os movimentos sociais, populares, sindical e as forças transformadoras, através de um programa, deve estar em permanente mudança e aberto ao novo, com capacidade de refletir sobre os novos tempos e os novos atores que surgem na conjuntura. Instituição, porque, por via eleitoral, participa de eleições e governa dentro das regras do jogo, está submetido, junto com as demais instituições brasileiras, à vida democrática e a suas imposições legais e constitucionais.
Os fins não justificam o uso de quaisquer meios, seja na disputa política eleitoral, seja na prática de governar ou de atuar no parlamento, ou na relação com a sociedade. A prática democrática e educativa, a vivência cotidiana da ética na política são a garantia de que o mundo novo, o novo homem e a nova mulher que se quer construir e ser, de fato vão acontecer.
Partido político como o PT, de esquerda, que veio para mudar, só tem sentido e sobrevive ao tempo se tiver um programa de transformação, se seus filiados e militantes mantiverem vivo o sonho de uma sociedade democrática, com justiça social, com igualdade econômica e lutarem pela utopia de ‘um outro mundo possível’.
Ao longo dos 32 anos do senhor maduro, muitas vezes o partido-instituição matou o partido-movimento, os supostos fins libertários, como em episódios mais ou menos recentes e em processos eleitorais, abrigaram meios nem sempre recomendáveis e de acordo com um partido da mudança, e muitas vezes o projeto, o sonho, a utopia renderam-se ao pragmatismo das alianças políticas, às formas de governar nem sempre transparentes e transformadoras.
Como tudo que se cria como movimento, necessariamente se institucionaliza com o tempo - e há muitos e próximos exemplos que confirmam a regra -, a dificuldade maior é manter o carisma, garantir acesa a chama de não se entregar ao jogo do mercado e da corrupção, não deixar-se dominar pela rotina e pela mesmice, ter olhos e ouvidos abertos, ser criativo, mirar no horizonte e não ficar limitado ao chão onde se pisa. Não é fácil, mas é necessário, imprescindível, para qualquer comunidade, congregação religiosa, movimento social e partido político. Para não tornar-se um morto-vivo ou ser varrido da história.
Mesmo com estes dilemas, a serem permanentemente enfrentados, o Partido dos Trabalhadores tem o que dizer e o que comemorar, no contexto histórico da política brasileira. Os tempos mudaram e a verdade se impôs. Ao contrário do que se dizia, o PT nunca foi bicho papão. Prova disso são as realizações ao longo dos 32 anos, a luta pela democratização do país, as inovações dos governos onde participou e participa, a dedicação a um projeto de país soberano, a defesa dos mais pobres e dos trabalhadores, razão principal de sua criação, a ressignificação da política como instrumento importante de ação coletiva e da construção de uma nação justa e soberana.
Em dezessete de fevereiro de dois mil e doze