terça-feira, 10 de maio de 2011

GASTAR, VOCÊ DISSE, GASTAR!

VIA CONTEÚDO LIVRE

A LADAINHA DO CONSUMIDOR - DEVO, NÃO NEGO. E VOU GASTAR MAIS

BRASILEIRO JÁ DEVE MAIS DO QUE GANHA - Ana D"angelo e Vera Batista


A maioria dos brasileiros entrou em uma perigosa armadilha financeira. Pela primeira vez em cinco anos, 53% das famílias gastam mais do que recebem. Segundo dados coletados pelo Banco Central, o trabalhador deve uma montanha de dinheiro a bancos e cooperativas de crédito: R$ 806 bilhões. Somente de janeiro a abril deste ano, os correntistas pagaram de juros R$ 54,4 bilhões às instituições financeiras — mais do que o corte que o governo Dilma pretende fazer no Orçamento de 2011. Especialistas atribuem a gastança à grande oferta de dinheiro na praça e ao hábito de manter as finanças com cheque especial e parcelamento de cartão de crédito. E recomendam: para sair do atoleiro dos juros, é preciso cortar gastos e trocar as dívidas mais caras por financiamentos baratos.


Estimuladas pela farta oferta de crédito, 53% das famílias têm dívidas que extrapolam seus rendimentos. Segundo especialistas, a prioridade deve ser equilibrar o orçamento e poupar para consumir mais tarde

Os brasileiros levaram à risca os conselhos do então presidente Luiz Inácio Lula da Silva para consumir, foram às compras em 2010 e perderam o controle. Pela primeira vez em cinco anos, 53% das famílias estão gastando mais do que recebem. Estudo elaborado pelas empresas de pesquisa Nielsen e Kantar Worldpane, a pedido da Associação Paulista dos Supermercados (Apas), mostra que a renda média subiu 13% no ano passado e atingiu R$ 2.146, mas as despesas foram maiores (R$ 2.171). Dados do Banco Central (BC) revelam que as pessoas devem R$ 806 bilhões a bancos e cooperativas de crédito.

Em 2010, os trabalhadores destinaram R$ 192 bilhões para pagar juros de empréstimos, segundo levantamento feito pela Federação do Comércio de São Paulo, com base em estatísticas do BC. Nos primeiros quatro meses do ano, os trabalhadores desembolsaram R$ 54,4 bilhões em juros, um quarto de todos os recursos que o governo quer usar com o programa Bolsa Família em 2011. Desse total, R$ 4 bilhões foram decorrentes da pressão da retomada de alta da taxa Selic pelo BC desde janeiro. Ou seja, com orçamento deficitário, o brasileiro tem que gastar mais em juros para equilibrar as contas.

O diretor de Economia e Pesquisa da Apas, Martinho Paiva Moreira, atribui o descontrole dos brasileiros à maior oferta de crédito, principalmente para a compra de imóveis e veículos. “O desejo de consumo, aliado à oferta de financiamentos, fez com que o trabalhador se embebedasse no crédito”, resume. O levantamento foi feito com base em uma amostra de 8.200 lares de todas as classes sociais, em cidades acima de 10 mil habitantes.

“Crédito, em nosso país, é e sempre foi sinônimo de suicídio. Os bancos cobram, em um mês, juros maiores do que são capazes de compensar com rendimentos de um ano em qualquer aplicação financeira”, avalia o analista de finanças da Moneyfit Antonio de Julio. O diretor da Apas acredita, no entanto, que o consumidor vai reequilibrar as despesas “de forma que a renda fique mais compatível com os gastos”.

O presidente da Apas, João Galasse, acredita que a renda continuará a crescer em 2011, ainda que em um ritmo menor, mas suficiente para ajudar no equilíbrio do orçamento familiar. Segundo ele, a taxa de crescimento dos gastos dos trabalhadores foi acima de 5% nos últimos cinco anos, mas a renda superou a despesa apenas em 1%. Em 2008, a pesquisa, que é anual desde 2006, indicou renda média de R$ 1.540 para consumo de R$ 1.558. Em 2007, o brasileiro ganhou R$ 46 a mais do que gastou. Em 2009, essa conta ficou equilibrada.

“O que temos observado é a dificuldade maior do consumidor de obter crédito barato, até para equalizar as contas, e os dados de inadimplência mostram elevação. Acende a luz amarela”, afirma o economista-chefe do Espírito Santo Investment Bank, Jankiel Santos. Isso não significa, diz ele, que possa haver uma crise, pois o mercado de trabalho ainda está aquecido e negociações eficazes na obtenção de aumento de salário. O que favorece o acerto do orçamento familiar. “Por isso, a necessidade de combate à inflação, buscando a convergência para as metas. Só assim para as famílias terem um alívio em suas despesas”, avalia Santos.

Segundo ele, as famílias devem priorizar o equilíbrio das contas, preparando-se para períodos de vacas magras. Caso seja necessário aperto monetário maior para frear a inflação, pode haver desemprego. “Dívida maior e inflação rodando relativamente forte não resultam em uma das situações mais agradáveis”, alerta.

Armadilha
Antonio de Julio, da Moneyfit, afirma que endividamento “é questão de matemática e não de classe financeira”. Caso o consumidor se deixe seduzir pela armadilha do crédito rotativo, como cheque especial e cartão de crédito, de taxas abusivas, dificilmente conseguirá sair sem danos drásticos à saúde financeira. Julio tem clientes de todas as faixas de renda. Vários deles, com ganhos mensais acima de R$ 15 mil, perderam a noção dos gastos e ficaram enredados no cheque especial. “Passaram por sofrido processo de educação financeira, reuniram a família, identificaram extravagâncias, venderam bens e se recuperaram. Tudo poderia ser evitado com um simples planejamento familiar”, ensina.

Segundo o especialista, antes de gastar, as famílias devem fazer uma “retrospectiva orçamentária”, que significa colocar na ponta do lápis gastos com luz, água, condomínio, aluguel, mensalidade escolar, impostos e taxas, prestações, cheque especial e cartão de crédito. A meta seguinte é cortar desembolsos desnecessários. “A pessoa deve procurar o gerente do banco e, olho no olho, trocar dívidas mais caras, do cartão de crédito, por exemplo, por mais baratas, como um consignado”, ressalta. Com o valor que eventualmente sobre do salário, o ideal é montar uma reserva para gastos inesperados, recomenda.

Na avaliação de Jankiel Santos, do Espírito Santo Investment Bank, os brasileiros deveriam se preocupar em poupar constantemente, seja pela questão previdenciária, para garantir a aposentadoria mais folgada adiante, seja para ter um colchão em momentos de reversão do quadro de bonança. “Se poupa hoje, pode, com as taxas obtidas, conseguir um investimento que pode lhe dar uma cesta de consumo maior adiante.”

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