País consome e poupa mais
ALBERTO TAMER – O Estado de S.Paulo
Há acontecimentos novos na economia que surpreendem. Os últimos indicadores do IBGE registram que a inflação aumentou, fechou o ano em 5,91%, mas o consumo não se retraiu e as aplicações em poupança superam recordes. As pessoas absorveram a alta dos preços; estão comprando e economizando mais. É só ver que, apesar da alta dos preços, continuam comprando carros.
E não são resultados distorcidos pelo pagamento do décimo terceiro, em parte destinado à poupança. A Caixa informa que até novembro, antes do abono, a captação líquida havia aumentado 60%. No ano passado, foram abertas 3,7 milhões de novas carteiras de poupança. O saldo líquido, a diferença entre depósito e retirada, fechou em R$ 126 bilhões. Deve-se acrescentar a isso investimentos em fundos de renda fixa ou não, sem contar investimentos em bolsa. Foi um ano que indica nova tendência. Sem dúvida isso se deve ao aumento da renda via salário, à maior segurança no emprego, à confiança na economia.
Vai durar. Os primeiros sinais dizem que o consumo interno pode manter níveis de crescimento semelhantes aos atuais. Devido ao forte aumento das vendas no fim do ano, mais 12%, os estoques estão baixos e as indústrias estão recebendo um número surpreendente de encomendas. As compras permanecem aquecidas pelo estímulo das promoções oferecidas nesta época. Há setores, como o de calçados, que iniciam o ano com toda a produção de janeiro vendida. Isso também ocorre no Polo Industrial de Manaus. As empresas se preparam para um aumento de vendas de 15% até o fim do primeiro semestre.
Mesmo assim, não se espera um grande aumento da produção industrial nos próximos meses para atender o aumento da demanda que está sendo suprida pelas importações. Em dezembro, a produção industrial cresceu 0,1%, segundo o IBGE, após um ano morno e classificado pelo IEDI como de estagnação. Há muito a fazer como estímulo ao investimento e defesa contra importações subsidiadas pelos governos dos países produtores. E não é apenas a China, são os Estados Unidos e a Europa. A isso se acrescenta a desvantagem do câmbio. Essas importações ajudam a conter a inflação, mas reduzem a capacidade das empresas de criar empregos.
Armadilha da renda. Esse é um outro fato que os últimos indicadores econômicos registram. Eles sinalizam que os consumidores não estão se retraindo na mesma proporção do aumento dos preços. Continuaram comprando e almoçando fora. Tudo indica que a alta dos preços ainda está sendo compensada pelo aumento da renda.
Um sinal disso é que o aumento da inflação, de 0,63% em dezembro, concentrou-se no setor de alimentos e bebidas, 1,32%, depois de meses seguidos de alta. É um setor que, além de ser essencial, representa uma conquista das classes de menor renda. Há sinais de que elas podem ter reduzido o consumo de carne pela alta preços, mas não o de outros alimentos.
Crise veio de fora. A alta dos preços dos alimentos representa uma crise importada. Ela se deve ao aumento das cotações das commodities. Há aumento da demanda pela China e asiáticos e menor oferta por fatores climáticos. Há também um movimento de compras e vendas provocado pelo deslocamento de aplicações no mercado financeiro, onde os juros caíram aos menores níveis da história, para papéis ligados a commodities. Há sinais de menor alta dos preços dos alimentos no País. Não se espera, porém, que isso venha a representar menor inflação nos próximos meses. O governo estuda novas medidas para desaquecer a demanda
E voltamos ao ponto inicial: o fato de as pessoas terem aumentado suas poupanças abre um canal para manter as compras de imóveis e bens duráveis. E, ao que tudo indica, podemos nos preparar para mais inflação que, por enquanto, insidiosa, é aceita pelos consumidores.
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