A geração que se vai – e a que está chegando
por Luiz Carlos Azenha
Algumas coisas me irritam profundamente no quadro político de hoje. Uma delas tem a ver com uma certa nostalgia do não vivido. Ela existe porque o Brasil nunca acertou as contas com o seu passado. Aqueles que promoveram o regime militar e tiraram proveito das políticas promovidas pelo autoritarismo, afinal, estão aí, fazendo pose de “democratas”.
Dito isso, na esquina entre os antigos militantes de esquerda e os jovens ávidos por dar um sentido não apenas material à vida paira uma espécie de túnel do tempo, que nos conduziria a março de 1964, maio de 1968 ou aos estertores do regime militar, nos anos 80, quando os estudantes na rua e os sindicalistas no ABC abreviaram a transição “lenta, gradual e segura” sustentada pelos quartéis.
Desde então, no entanto, o Brasil mudou. Incorporou milhões de brasileiros ao consumo e, ainda que precariamente, à cidadania. Sem atentar para essa nova realidade, o risco de que continuemos eternamente num debate entre UDN-PSD-PTB é grande. E o risco de reeditar as batalhas que já foram — desconexas da realidade atual — é grande. Costumo dizer que a síndrome da “nostalgia de dias não vividos” afeta um dos lados do confronto. Do outro, há a síndrome da falta de votos.
Se as tecnologias da informação trouxeram grande avanços à capacidade individual de produzir e disseminar conteúdo, também fortaleceram um lado perverso do comportamento social. O da fulanização do debate político, travado na troca de acusações pessoais e numa obsessão doentia pelo que diz e faz o outro.
Acho importantíssima a crítica política e nenhum de nós, nos tempos de hoje, pode ou deve ser poupado dela. Na prática horizontal da blogosfera, por exemplo, ninguém pode pretender se colocar em um pedestal.
Porém, como insisti quando fui chamado a falar no Encontro Nacional de Blogueiros Progressistas, essa prática cotidiana desvia o foco do que considero o principal: a produção de conteúdo informativo de qualidade, para contrapor ao que é produzido pela mídia tradicional. Conteúdo regional e plural, que dê conta de atender às demandas não atendidas pelos grandes grupos de comunicação, com seus interesses políticos, econômicos, ideológicos e de classe.
Na blogosfera, isso exige não apenas dinheiro, mas capital humano. Exige conhecimento das tecnologias de informação, mas também que os blogueiros recebam treinamento mínimo em técnicas de apuração jornalistica, sem as quais patinaremos eternamente na repetitiva crítica pessoal, no ouvir dizer e no achismo. Sempre digo que cada pessoa pode encontrar o seu “potencial informativo” a partir de sua própria realidade física e experiência profissional: o médico que escreva sobre medicina e o morador de Braúna, no interior de São Paulo, que escreva sobre os problemas de Braúna. Isso não impede que ambos escrevam sobre outros assuntos, mas com certeza terão maior chance de sucesso se tirarem proveito de uma experiência já existente.
Além desta agenda positiva, propositiva e de futuro, acredito que os antigos debates serão devidamente sepultados pelo pragmatismo das novas gerações: elas querem saber quando limparemos o rio Tietê, quando os brasileiros que não tem acesso à água e ao esgotamento sanitário serão atendidos pelos governos, quando a banda larga será acessível a todos. Isso não precisa ser feito às custas do abandono de outras causas, mas articular a militância diária com questões concretas pode ajudar a evitar a cansativa, improdutiva e inconsequente reedição das “batalhas” do passado.
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